A Humanidade Arcaica tinha,
na sua génese, uma percepção e assimilação dos fenómenos naturais em nada a ver
com a maior parte dos seres humanos de hoje. Entre várias justificações, poderá
mencionar-se o facto de actualmente sermos seres sociais mais distantes dos
espaços verdes (locais, aliás, cada vez mais raros e/ou inexistentes) dos meios
urbanos, onde se concentra a maior parte da população, que tenta fugir das
regiões rurais, onde, por excelência, se avistam as terras, montanhas, rios,
etc. em todo o seu esplendor. Esses locais são também zonas de referência para
todos os amantes da natureza, e maravilhosos spots de culto ritualístico pagão,
onde as forças do Divino estão indiscutivelmente mais presentes.
Somado a tudo isso, podemos
também referir-nos à questão da Globalização e do avanço tecnológico, que
permite uma desvirtualização das realidades físicas, as que se querem próximas
ao dinamismo natural, em virtude do artifício, da ilusão, e do comodismo que em
nada comungam com a transparência e autenticidade de um mundo desprovido de
tecnologia avançada, que dispersa as pessoas e as afasta em termos sensoriais
da Natureza que os rodeia. No fundo, a ideia que aqui pretende ser traduzida é
mesmo a de que os nossos antepassados conseguiam aperceber-se das energias em
seu torno, e conseguiam também ascender com mais facilidade a estados elevados
de consciência, percebendo, portanto, a sinalização dos limites do mundo
terreno e os guardiões dos quatro cantos da Terra, bem como toda a mística
envolvente do planeta.
Esses Guardiões (Génios numa
denominação francamente mais conhecida), alusivos às entidades tão antigas
quanto a humanidade, representam os Espíritos Superiores da Natureza, que são
permeáveis até à mudança de era astrológica, sinalizada pela entrada de
Aquário, que anuncia o fim da influência cristã de Peixes e o retorno dos
Velhos Deuses, desta vez adaptado ao mundo moderno (daí surgirem também as
novas vertentes de Neopaganismo e, em casos extremos, o Tecnopaganismo). Isso
reflecte uma transformação ao nível dos Guardiães, que são reconhecidos como
Atalaias no mundo moderno. No fundo, contudo, eles serão sempre aqueles que
testemunham um ritual, e que nos darão a chave para abrirmos os portais dos
mundos invisíveis que definirão a brecha para outras realidades transfiguradas,
onde ocorre o trabalho mágico, e onde tem lugar, também, a transfiguração
iniciática do neófito.
Existem vários tipos de
Guardiões, sendo que a cada corresponde uma tradição. Na vertente da Bruxaria
Tradicional, muitos deles são os Grigori de Enoque, os Anjos Caídos de Lúcifer,
etc., aqueles que trazem o Fogo da Iniciação à humanidade, descendo das alturas
celestes para o mundo da matéria, ao passo que na vertente mais moderna da
Bruxaria, eles são deslocados para as quatro regiões cósmicas que ladeiam a
Terra, sendo conhecidos como Torres de Vigia, Atalaias, etc. Esta “mudança”
deixa transparecer, claramente, não a descida do Fogo do Conhecimento à
humanidade por via da gnose verde, a imersão do iniciado nas florestas e matas,
mas a procura do Homem no acesso a essa gnose “exilada”.
Indubitavelmente, temos aqui
implícito que após a tomada dos bosques e florestas por parte do betão e
estradas citadinas, bem como o consequente afastamento dos seres humanos face
às suas percepções do divino nos meios verdes, levou à necessidade de se
reajustar a interacção com os mundos invisíveis, assim como a sua percepção
sobre estes. É por isso que os Atalaias se inserem no campo do neopaganismo
(mais ou menos década de 60), com o aparecimento de novas formas de
religiosidade de teor pagão, ou religiões que se propõe a resgatar as premissas
que fundaram as várias variantes da Arte Sem Título pelo mundo fora, cujo
ímpeto era o de colocar o Iniciado em contacto com as forças mais primitivas
que possam existir no planeta.
Esta nova designação que lhes
é atribuída aporta também conotações distintas que antes não existiam e que são
adaptações à era que se avizinha e cujas influências já se fazem sentir, a era
astrológica de Aquário, que não só se pauta pela recuperação dos cultos
pré-cristãos, mas também por uma emergência ecológica que se enraíza na
sociedade e floresce por entre os praticantes. Afinal de contas, por muito que
se tente uma prática assemelhada às formas antigas, a verdade é que a passagem
do tempo, e a evolução das sociedades, impõe condicionantes que anteriormente
não existiam (exemplo – a escassez de zonas verdes pode obrigar a uma prática
ritualística em casa, o que limita em muito o contacto com as forças primitivas
da Terra e com a substância dos Deuses. Isso pode também implicar dificuldades
na recolha de plantas, pedras ou outros utensílios usados na Arte, obrigando a
uma compra directa em lojas, que dispensa o ritualizar das colheitas que
instruem a Bruxa e potenciam o seu trabalho).
Posta esta confrontação de
vertentes (Guardiões, Vs. Atalaias) importa referir que os Génios de Lugar e
Espíritos Tutelares da Natureza são a primeira grande forma de contacto com os
Espíritos Arcaicos do Planeta. Como tal, esse contacto ocorre sobretudo em
regiões sagradas, como o caso de um bosque, de uma montanha, ou outro espaço
criado naturalmente pela Terra, onde a ausência humana seja considerável.
Por oposição, todos os
assuntos satélite decorrentes deste (Grigori, Principados, Fadas, Lucífer e os
Anjos Caídos, etc.) não são mais do que decalques do tema original e basilar:
os Génios de Lugar e Espíritos Tutelares, grosso modo, o culto das Árvores e
Pedras. Esses assuntos são, então, mitologia, sendo o primeiro ponto o único
que se afigura ao real, sem figuras de estilo, metáforas, ou artifícios.
Os Atalaias relacionam-se com
tudo o que tenha a ver com os mundos supra-sensíveis, nomeadamente as regiões
cósmicas que ladeiam a Terra, os mundos que só poderão ser desvelados pelo
olhar exaltado, em detrimento da visão quotidiana e mundana. Por seu turno, os
Guardiões relacionam-se mais com os locais mágicos e suas especificidades
morfológicas, aquelas que constituem o espaço físico e a sua contra-parte
etérica. Apesar da vertente neopagã não contemplar a existência mais física
destes espíritos, e suas manifestações terrenas, os Espíritos, que vivem na 5ª
Essência da Matéria, o Éter, existem também nos lugares físicos e palpáveis.
Daí podermos ouvi-los, vê-los e exercer formas de contacto a um nível muito
básico, porém extremamente profícuo e real. E é essa mensagem elementar que os
Guardiões nos pretendem transmitir.
Contudo, esse paradigma é
reformulado com a passagem para a Era Astrológica de Aquário, e a criação de
toda a mitologia que necessita de ser desvelada. Se em Peixes tínhamos a
predominância de uma Igreja Católica austera, criadora de Satã, o eterno
opositor a um Cristo-mártir, crucificado pela humanidade sem característica
nenhuma de iniciático, um Cristo que não sofreu nenhum processo de iniciação na
cruz, mas que ofertou a sua carne em prole de uma humanidade ingrata e
avarenta, a Nova Era assinalará o retorno dos Velhos Deuses, a reemergência da
iniciação na carne e espírito, o reencontro com as forças divinas da Natureza,
e a chegada de uma Alma Antiga a um Mundo Moderno.
Texto por Aquam